quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

O fim de uma longa farsa

O fim de uma longa farsa
Olavo de Carvalho
Jornal do Brasil, 10 de Fevereiro de 2007

O ex-chefe da espionagem romena, Ion Mihai Pacepa, confessou recentemente
que a onda de acusações ao Papa Pio XII, que começou com a peça de Rolf
Hochhuth, O Vigário (1963), e culminou no livro de John Cornwell, O Papa de
Hitler (1999), foi de cabo a rabo uma criação da KGB. A operação foi
desencadeada em 1960 por ordem pessoal de Nikita Kruschev. Pacepa foi um de
seus participantes directos. Entre 1960 e 1962 ele enviou a Moscovo centenas
de documentos sobre Pio XII. Na forma original, os papéis nada continham que
pudesse incriminar o Papa. Maquiados pela KGB, fizeram dele um virtual
colaborador de Hitler e cúmplice ao menos passivo do Holocausto (leiam a
história inteira aqui).

Foi nesses documentos forjados que Hochhuth se baseou para escrever sua
peça, a qual acabou por se tornar o maior “succès de scandale” da história do
teatro mundial. O dramaturgo talvez fosse apenas um idiota útil, mas Erwin
Piscator, director do espectáculo e aliás prefaciador da edição brasileira
(Grijalbo, 1965), era um comunista histórico com excelentes relações no
Kremlin e na KGB. Muito provavelmente sabia da falsificação.

Costa-Gavras, o director que em 2001 lançou a versão cinematográfica da peça,
decerto cabe com Hochhuth na categoria dos idiotas úteis. Mas o mesmo não se
pode dizer de John Cornwell, que mentiu um bocado a respeito das fontes da
sua reportagem, dizendo que havia feito extensas investigações na Biblioteca
do Vaticano, quando as fichas da instituição não registravam senão umas
poucas e breves visitas dele. Cornwell é vigarista consciente. O conteúdo da
sua denúncia já estava desmoralizado desde 2005, graças ao estudo do rabino
David G. Dalin, The Myth of Hitler's Pope, publicado pela Regnery, do qual o
público brasileiro praticamente nada sabe até agora, pois o livro não foi
traduzido nem mencionado na grande mídia. Com a revelação das fontes, nada
sobra de confiável na lenda do "Papa de Hitler", que, no Brasil, graças à
omissão da mídia e das casas editoras, tem campo livre para continuar sendo
alardeada como verdade pura. Da Grijalbo nada se pode esperar. É
tradicionalmente pró-comunista e nem sei se ainda existe. Mas a Imago,
editora de O Papa de Hitler, parece ser honesta o bastante para reconhecer
sua obrigação moral de publicar o livro do rabino Dalin. Noto, de passagem,
que eu mesmo, quando li a denúncia de Cornwell, acreditei em tudo e cheguei
a citá-la em artigo. Que Deus me perdoe.

***



0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial