terça-feira, 1 de julho de 2008

O SUICÍDIO DEMOGRÁFICO

O SUICÍDIO DEMOGRÁFICO

 

O declínio da população europeia parece irreversível. Dentro de cinquenta anos, viveremos na feliz “Eurábia”. Com as taxas de natalidade actuais, a população da Europa será reduzida a metade no curso de uma geração.

O historiador Arnold J. Toynbee dizia que se escrevem poucos livros sobre a morte de uma civilização, e por uma boa razão. Muito raramente existe um assassino: em geral, trata-se de suicídio. A América está destinada a "ficar só" na luta contra o ultrafundamentalismo islâmico não – ou não apenas – porque a maioria dos governantes europeus esteja com medo ou indisposta para o combate. Ficará sozinha tecnicamente, porque dentro de menos de um século os europeus não existirão. Serão varridos pela demografia assim como o foi o império romano, que não caiu porque as suas compactas legiões se tivessem tornado menos compactas, mas sim porque, com a prática difusa do aborto e do infanticídio, já não eram constituídas por legionários romanos. Alistavam-se bárbaros, proclamando-se apressadamente, talvez, cidadãos romanos. E, quando perceberam que estavam em maioria, tomaram o poder.

Essa é a tese de Mark Steyn, no seu "America Alone: The End of the World as We Know it" (Regnery, Washington 2006), o livro mais importante de 2006, do qual se espera uma rápida tradução portuguesa.

O tema do livro é aquele que o Papa João Paulo II chamava desde 1985, com expressão destinada a passar à História, de "suicídio demográfico" do nosso continente. Por todo o mundo o que deixa os não-europeus perplexos é que na Europa este tema dramático não esteja no centro do debate cultural e mesmo das campanhas eleitorais. Nenhum país da Europa Ocidental possui uma taxa de fecundidade por mulher que corresponda ao nível mínimo de manutenção da população (2,1 filhos por mulher) indicado pelos demógrafos.

Certamente, as estatísticas poderão ser alteradas concedendo-se a cidadania aos imigrantes, mas trata-se de um truque que já foi tentado com resultados ruinosos no império romano. Transformar os "bárbaros" em cidadãos por meio de lei não fazia deles cidadãos romanos culturalmente, assim como transformar imigrantes muçulmanos ou chineses em cidadãos europeus por decreto não significará fazer deles europeus pela cultura e pela integração.

Do "suicídio demográfico" se ocupam muito os economistas, sobretudo aqueles especializados em previdência social. De facto, na Europa Ocidental – não obstante todos os países procurem adiar ao máximo possível a idade de aposentação – cresce inexoravelmente o número de aposentados e em diversas regiões cada trabalhador já suporta o encargo de dois aposentados.

Algum entusiasta do "modelo europeu" pode pensar – ainda que poucos tenham a coragem de o dizer – que a eutanásia à moda holandesa vai dar cabo dos velhos inúteis e resolver o problema. A recusa da classe política de muitas nações europeias a recorrer às drásticas reformas sugeridas pelas instituições financeiras internacionais parece não decorrer tanto da compaixão pelos aposentados – ou do desejo de não perder os seus votos, visto que em breve serão a maioria dos eleitores –, mas de estar a esconder a cabeça na areia diante da dramática urgência do problema demográfico.

Não há nenhuma garantia de que as civilizações durem para sempre. O seu modo normal de morrer é precisamente o demográfico. Além do aborto e do infanticídio, os romanos da decadência praticavam uma forma primitiva de eutanásia (por certo distante daquela em camisola branca dos Países Baixos de hoje), que consistia em abandonar os anciãos doentes sem os tratar ou alimentar. Os bárbaros chegam quando estas práticas já haviam enfraquecido o império de Roma, de cujas ruínas surge a civilização dos cristãos que não praticam o aborto e que cuidam dos velhos e doentes. Mas desta vez o que vai surgir das ruínas da Europa?

Não é necessário citar os fundamentalistas islâmicos e a invasão muçulmana frustrada pela via militar em Poitiers, Lepanto e Viena que será bem sucedida no século XXI pela via demográfica, para perceber que a civilização européia se arrisca a sofrer o mesmo destino da romana.

Nesse meio tempo – e sob este ponto de vista o livro de Steyn é também divertido – os políticos europeus escondem os crucifixos e os presépios para não incomodar os muçulmanos, ou dedicam o seu tempo a discutir se ensinar os homens europeus a urinar sentados e não em pé, com a consequente abolição dos mictórios, "último refúgio de um machismo patriarcal", não poderia contribuir para acentuar a igualdade entre homens e mulheres e a comprazer as feministas!

O mesmo escritor atribui o suicídio demográfico à "falta de confiança na própria civilização". A meu ver, uma expressão mais precisa é aquela do Papa Bento XVI: "falta de esperança". Depois de haver perdido a virtude da fortaleza, a Europa perdeu também a esperança no futuro. A civilização que não espera não faz filhos: mas são exactamente as civilizações destinadas a desaparecer. O desaparecimento de Roma não significou o desaparecimento da melhor parte da sua herança: havia um São Bento para recolhê-la. Hoje, parece que só um outro homem chamado Bento se ergue entre a Europa e o seu suicídio anunciado por Steyn.

 

José António Ribeiro de Carvalho

Ermesinde

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